segunda-feira, 4 de julho de 2011

Escutatória


É de Rubens Alves o super interessante texto que recebi do meu amigo Sérgio Thadeu e que divulgo na data de hoje:


"Sempre vejo anunciados cursos de oratória. Nunca vi anunciado curso de escutatória.

Todo mundo quer aprender a falar... Ninguém quer aprender a ouvir.

Pensei em oferecer um curso de escutatória, mas acho que ninguém vai se matricular.

Escutar é complicado e sútil. Diz Alberto Caeiro que... Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores.

É preciso também não ter filosofia nenhuma.

Filosofia é um monte de idéias, dentro da cabeça, sobre como são as coisas.

Para se ver, é preciso que a cabeça esteja vazia.

Parafraseio o Alberto Caeiro: Não é bastante ter ouvidos para ouvir o que é dito.

É preciso também que haja silêncio dentro da alma. Daí a dificuldade: A gente não agüenta ouvir o que o outro diz sem logo dar um palpite melhor...

Sem misturar o que ele diz com aquilo que a gente tem a dizer.

Como se aquilo que ele diz não fosse digno de descansada consideração...

E precisasse ser complementado por aquilo que a gente tem a dizer, que é muito melhor.

Nossa incapacidade de ouvir é a manifestação mais constante e sútil de nossa arrogância e vaidade.

No fundo, somos os mais bonitos...
Tenho um velho amigo, Jovelino, que se mudou para os Estados Unidos
estimulado pela revolução de 64.

Contou-me de sua experiência com os índios: Reunidos os participantes, ninguém fala.



Há um longo, longo silêncio.

Vejam a semelhança...

Os pianistas, por exemplo, antes de iniciar o concerto, diante do piano, ficam assentados em silêncio...

Abrindo vazios de silêncio... Expulsando todas as idéias estranhas.

Todos em silêncio, à espera do pensamento essencial. Aí, de repente, alguém fala.

Curto. Todos ouvem. Terminada a fala, novo silêncio.

Falar logo em seguida seria um grande desrespeito, pois o outro falou os seus pensamentos...

Pensamentos que ele julgava essenciais.

São-me estranhos. É preciso tempo para entender o que o outro falou.

Se eu falar logo a seguir... São duas as possibilidades.

Primeira: Fiquei em silêncio só por delicadeza.

Na verdade, não ouvi o que você falou.

Enquanto você falava, eu pensava nas coisas que iria falar quando você terminasse sua (tola) fala.

Falo como se você não tivesse falado.

Segunda: Ouvi o que você falou. Mas, isso que você falou como novidade eu já pensei há muito tempo.

É coisa velha para mim. Tanto que nem preciso pensar sobre o que você falou.

Em ambos os casos, estou chamando o outro de tolo. O que é pior que uma bofetada.

O longo silêncio quer dizer: Estou ponderando cuidadosamente tudo aquilo que você falou.

E, assim vai a reunião.

Não basta o silêncio de fora. É preciso silêncio dentro. Ausência de pensamentos.

E aí, quando se faz o silêncio dentro, a gente começa a ouvir coisas que não ouvia.

Eu comecei a ouvir.

Fernando Pessoa conhecia a experiência...

E, se referia a algo que se ouve nos interstícios das palavras... No lugar onde não há palavras.

A música acontece no silêncio. A alma é uma catedral submersa.

No fundo do mar - quem faz mergulho sabe - a boca fica fechada. Somos todos olhos e ouvidos.

Aí, livres dos ruídos do falatório e dos saberes da filosofia, ouvimos a melodia que não havia...

Que de tão linda nos faz chorar.

Para mim, Deus é isto: A beleza que se ouve no silêncio.

Daí a importância de saber ouvir os outros: A beleza mora lá também.

Comunhão é quando a beleza do outro e a beleza da gente se juntam num contraponto.


Esse texto me fala fundo n´alma, preciso aprender a escutar mais, estar mais presente e paciente, me colocar mais no lugar do outro, no ponto de vista do outro. Uma forte fonte de inspiração para mim, e para você?

6 comentários:

  1. Querida Sandra... que belíssimo post!

    Estava precisando ler isso e com certeza foi uma fonte de inspiração para mim!

    Tenha uma ótima semana!

    ResponderExcluir
  2. Sandra,

    Penso que vou me repetir. Mas vc sp traz mensagens importantes para o meu crescimento. Como o silêncio faz bem! Em grupo ou em momentos a sós! É exercício de vida estar em silêncio (de tudo interiormente) para ouvir. É difícil! Mas isso faz parte do crescimento.

    Obrigada por mais um tema para reflexão!

    Excelente semana!
    Girassóis nos seus dias.

    Beijos

    ResponderExcluir
  3. Bom dia Sandra querida,


    Que texto lindo, obrigada por compartilhar, precisamos mesmo aprender a escutar. As vezes o silêncio seria nosso melhor amigo e não nos damos conta disso... Achamos que ele nos prova que estamos sozinhos e na verdade não é bem assim...
    No silêncio nos descobrimos e descobrimos o outro, é que a gente ainda não aprendeu...rsrs
    Mas ainda dá tempo...

    Beijos e uma linda semana.
    Ani

    ResponderExcluir
  4. Oi Sandra,
    sem sombra de dúvida, esse texto me renova nos aprendizados da vida.Já o postei lá no Fractais em data antiga, porém nunca é demais trazê-lo aos olhos e á mente de todos, para uma reflexão precisa.
    desde há muito o conheço( o texto e o Rubem)e, sou fã incondicional dos dois.Em exercício profissional uma das pequenas grandes ações de todo professor é praticar a escutatória, pois só se percebendo ouvido o aluno terá mais interesse em ouvir tbém.
    Que a mensagem se espalhe aos quatro ventos!
    Um bjo amiga,
    Calu

    ResponderExcluir
  5. Texto fantástico.

    "Falar é despender; escutar é adquirir"
    (Provérbio)

    Beijo.

    ResponderExcluir
  6. Oi Sandra!Você está escutando aí as palmas que estou batendo para esse texto e para a sua iniciativa de postá-lo no seu blog? Magnífico!!
    Temos dois ouvidos e uma boca, mas não sabemos utilizá-los. Vc já reparou como quando vc conta algo, a outra pessoa logo em seguida fala algo dela própria? Isso acontece com mais frequência do que deveria. As pessoas estão tão centradas em si que não conseguem ouvir o outro, nem mesmo ficarem em silêncio. O silêncio pode dizer muito, tem um sgnificado. Mas as pessoas não estão prontas para enfrentá-lo.
    Super beijo pra vc!

    ResponderExcluir